Crítica: Apartamento 7A (2024), de Natalie Erika James
O filme prelúdio de O Bebê de Rosemary (1968) tenta dar voz às origens de um dos clássicos do terror, mas seu resultado é apenas uma cópia barata.
No final dos anos 1960, O Bebê de Rosemary (1968) despontou como um marco do cinema de terror pós-moderno. Sendo, na maioria, um reflexo das mudanças culturais ansiosas pautadas pela ascensão de teorias da conspiração, o filme de Roman Polanski rejeitou resoluções narrativas tradicionais e apostou no questionamento da confiabilidade ontológica, adotando, assim, um catalisador psicológico, especialmente nas sequências de sonhos, o que contribuiu para a atmosfera perturbadora do longa-metragem. O resultado é uma obra de exploração de medos sociais do anormal, edificado por perturbações psicológicas sustentadas pela estética do gótico. No seu interior, há uma subversão de uma hierarquia entre vítima e predador dentro do contexto da maternidade — caráter ironizado pelos crimes do diretor: Polanski foi acusado de estuprar uma garota de treze anos e fugiu para França ainda em 1978. De toda forma, até hoje, O Bebê de Rosemary é um dos filmes mais assustadores da história.
Embarcando na moda de produção de predecessores de canônicos, Apartamento 7A (2024) se atenta para algumas semanas antes dos eventos do clássico de Polanski. Nessa nova obra, seguimos Terry Gionoffrio (Julia Garner), uma jovem bailarina que sonha em conquistar a fama e o sucesso. No entanto, após cair em uma apresentação e sofrer uma grave lesão no pé, sua carreira é posta em risco. Todavia, a sorte de Terry muda quando ela se torna protegida de um casal enigmático de idosos, Minnie (Dianne Wiest) e Roman (Kevin McNally), no luxuoso edifício Bramford, com a promessa de uma segunda chance na carreira. Depois de uma noite misteriosa com Alan Marchand (Jim Sturgess), amigo do casal e influente no teatro da cidade, a jovem não consegue lembrar ao certo do ocorrido, mas desfruta do triunfo recente. Conforme eventos estranhos se fazem presentes e alucinações se tornam mais recorrentes, Terry descobre que está grávida, o que coloca sua carreira e vida em risco.
Existem dois problemas principais com Apartamento 7A. O primeiro é que sua narrativa é sustentada por um desenrolar Deus Ex Machina, o que faz com que seus eventos não consigam ser convincentes nem no nível diegético. Olhe, por exemplo, a inserção de Terry dentro do culto satânico: a bailarina vai ao apartamento de Alan, mas, pelo consumo exagerado de remédios para sua lesão, acaba vomitando na sarjeta. Nisso, o casal de idosos a resgata e, na manhã seguinte, a oferece para morar em um apartamento que eles compraram como investimento, mas que acabam dando para aqueles que precisam, como forma de contornar sua solidão. Terry aceita sem pensar duas vezes, mesmo com a reprovação de uma amiga. No restante do filme, tudo funciona em prol de Terry se manter presa nessa situação: quando uma freira descobre que a jovem estava grávida, nada é feito, ao passo que Marchand parece não se importar se colocaria sua carreira em jogo caso se envolvesse com Terry. Com isso, não há nenhum atrito, e a sensação é de que tudo acontece de forma fácil e brusca demais. Mesmo sabendo do tráfico humano sobrenatural orquestrado, você não compra a ideia de que alguém cairia tão facilmente nesse esquema.
O segundo maior problema é decorrente do primeiro e só é mais incômodo se você já assistiu O Bebê de Rosemary algumas vezes. No caso, a história de Apartamento 7A é uma réplica do que acontece no filme de Polanski. Porém, as diferenças fazem o clássico sair na frente. No filme mais antigo, Rosemary (Mia Farrow) é vítima até de seu marido, Guy (John Cassavetes), que, em favor de sua carreira de ator, entrega sua esposa de mão beijada para o grupo satânico. Com isso, sua gravidez faz mais sentido, enquanto seu desespero é mais forte e o questionamento da sua sanidade, mais destacado. Nesse novo filme, a preocupação maior em seguir os passos do clássico faz com que a criatividade seja perdida: Terry é uma jovem solteira que engravida de um chefe em um teste do sofá, mas essa sua situação social não é usada em nenhum momento em prol do horror. Com isso, as agressões e manipulações que Terry sofre se resumem às mesmas impostas para Rosemary, mas em um contexto diferente. Isso, no final, soa mais como preguiça, do que um estabelecimento de um modus operandi.
Entretanto, o que a diretora Natalie Erika James traz de novidade nem sempre ressoa bem. Ela é uma iniciante e seu primeiro trabalho de maior nome, Relíquia Macabra (2020), foi uma longa-metragem de ritmo lento que não se portava como um filme de terror. De novo, essa monotonia fica clara pela história, enquanto, no estilo, ela varia entre seguir um caminho promissor e cair em armadilhas vergonhosas. No primeiro caso, os melhores toques estão nos detalhes: Terry passa mal quando entra em uma igreja e tem sua mão queimada ao encostar em uma bíblia. Porém, nos momentos mais decisivos, o filme tropeça: na cena em que ela sofre o abuso, a metáfora usada é um teatro musical com influência do Expressionismo Alemão. O sentimento causado é mais de vergonha do que de medo. Para mais, na passagem em que Vera (Rosy McEwen) tem seus ossos misteriosamente quebrados, temos outro instante que recusa tirar proveito do visual.
Apartamento 7A encerra assim: uma releitura barata que tenta pegar carona de um clássico, mas apenas consegue emprestar o esqueleto da história. Por mais que James consiga construir algumas cenas de suspense e ansiedade — principalmente aquelas relacionadas ao ferimento no pé de Terry —, o que temos entre isso é duvidoso demais: um diabo de glitter e lantejoulas; uma cidade de CGI muito falsa; uma atmosfera que depende unicamente dos tons mortos da fotografia; e a irritante Dianne Wiest. O filme falha em trazer algo novo para a história antecessora de Rosemary, logo, é uma obra que nasce sem propósito e sem essência. O que sobra não é muito divertido também.